terça-feira, julho 27, 2010

REDES SOCIAIS, AGENTES E AÇÃO SOCIAL: EM QUE OS ESCRITOS DE CLEGG E DE EMIRBAYER E GOODWIN PODEM COLABORAR?

Fazer uma comparação entre os escritos de Clegg, mais precisamente o primeiro capítulo de seu livro intitulado “As organizações modernas” e o artigo de Emirbayer e Goodwin sobre análise de rede, cultura e problema de agência, a princípio parece algo inconciliável. Numa primeira análise é fácil se prender nos objetos descritos, por um lado, Clegg escreve sobre o advento da pós-modernidade e as formas (ou não) de gestão, por outro lado, há uma discussão sobre análise de rede como método de pesquisa em sociologia, na qual os autores procuram descrever teorias adjacentes e suas falhas frente à sua proposta.
Relendo os trabalhos é possível contrastar relações e posicionamentos sobre metodologias de pesquisa, que traz à tona conceitos e situações utilizados pelos autores para reforçar indicações de caminhos para entendê-los e para serem utilizados em novas oportunidades de pesquisas.
Clegg (1998) demonstra que o processo de racionalização do mundo desembocaria no aprisionamento da humanidade numa masmorra, o colete de forças da burocracia, idéia que teve, até os dias de hoje, uma influência enorme e diversificada sobre a teorização das organizações realizada pelos cientistas sociais. O que resulta dizer segundo o autor, que a teoria organizacional é, em vários aspectos, uma disciplina modernista por excelência.
Quando Clegg (1998, p.07) afirma que “a moralidade da burocracia radica na sua promessa implícita de tratar cada um apenas de acordo com seu estatuto, enquanto membro da organização, independentemente de quaisquer outros aspectos da sua identidade”, demonstra que os cientistas sociais também “bebiam dessa fonte”, pois conforme Emirbayer e Goodwin (1994), os três modelos implícitos na literatura de análise de rede: modelos de relacionamento entre culturas, agência e estrutura social não tem conseguido explicar de forma satisfatória os processos históricos, pois devem levar em conta que um enfoque adequado da explanação histórica que contemple tanto a estrutura social como as perspectivas culturais na ação social. O que confirma que os princípios do universalismo burocrático insistiam que cada um devia ser tratado de acordo com os direitos, responsabilidade, normas e deveres inerentes à sua posição, enquanto membro de uma organização e a cor, sexo ou opção sexual devia ser totalmente irrelevante (CLEGG, 1998).
Enquanto Emirbayer e Goodwin (1994) defendem que idéias como estrutura social, centralidade de rede, distância, coesão e redes sociais, termos usados como metáforas por outros sociólogos, podem ser operacionalizados para propostas de pesquisa empírica, Clegg (1998) afirma que uma perspectiva contextualizada deve reconhecer a possibilidade de muitas entidades relevantes, para além do homo economicus, passíveis de incorporação e de uso. Pois para o autor as identidades não são transmitidas, nem emanam diretamente de uma cultura dominante. O que confirma segundo Emirbayer e Goodwin (1994), que a formação cultural habilita os atores históricos de diversas formas, por exemplo, pelo ordenamento de seus entendimentos do mundo social e de si mesmos, pela construção de suas identidades, metas, aspirações e pela representação de papeis significantes, ou não.
Para Clegg (1998, p. 09),
os agentes são experimentalistas pragmáticos num mundo potencialmente muito incerto, ambivalente, contraditório e ambíguo do que qualquer cientista natural podia prever em laboratório. Perante este quadro caótico, os agentes tentarão impor os seus próprios ‘circuitos de poder’, configurando o campo de ação em moldes que permitam realizar, por um lado, os seus interesses pessoais e, por outro, a adesão e adoção destes mesmos interesses por parte de outras agências. A construção de redes relativamente estáveis, com um número limitado de direções ou vias, sob o controle das agências em questão é um dos principais mecanismos de estabilização dos campos de força que as agências percorrem. Não raras vezes, a cultura foi considerada como uma dessas vias, mais precisamente sob a forma de conhecimentos religiosos, crenças e práticas referentes a toda uma população.
Nesse sentido, Emirbayer e Goodwin (1994), afirmam que as formações culturais são importantes porque tanto restringe como habilita atores históricos, da mesma forma das estruturas da rede. Estruturas culturais restringem os atores em certas possibilidades de ações. Bem como restringe os discursos com base no que é necessário para dizer o que os outros querem ouvir.
Além disso, a formação cultural habilita os atores históricos de diversas formas, por exemplo, pelo ordenamento de seus entendimentos do mundo social e de si mesmos, pela construção de suas identidades, metas, aspirações e pela representação de papeis significantes, ou não (EMIRBAYER E GOODWIN, 1994). Nesse sentido pode-se associar ao que Clegg (1998) chamou de desdiferenciação, que está presente na recusa pós-modernista de separar o autor da sua obra, ou a audiência da atuação; na transgressão pós-modernista da fronteira (mais bem ou mais mal sucedida) entre literatura e teoria, entre cultura de elite e cultura popular, entre o que é propriamente cultural e o que propriamente social. Que é complementado por Emirbayer e Goodwin (1994), que afirma que a autonomia individual é em si mesma um fenômeno construído; isto é, autonomia individual é somente possível pela multiplicidade de estruturas – societal e cultural – nas quais os atores sociais estão situados em algum dado momento. Também é possível através da localização dos atores entre a multiplicidade de culturas estruturais como idiomas, discursos e narrativas. Deve-se deixar claro que por outro lado, como afirma Clegg (1998), que as grandes narrativas do passado, com seus princípios de progresso, de racionalidade e de ciência deixaram de ter qualquer crédito.
Para Clegg (1998), os indivíduos e as agências, no interior e em redor das organizações, constituem atores cognoscíveis que ponderam os seus próprios interesses e as conveniências dos outros. As agências e os atores procuram influenciar as idéias veiculadas no quotidiano da vida, da tática e da estratégia organizacionais, recorrendo a todos os meios de podem dispor em situações mais ou menos complexas, caracterizadas por normas mais ou menos opacas e variáveis, tendo em vista o seu próprio proveito ou o de terceiros. Emirbayer e Goodwin (1994) enfatizam que agência humana significa que o momento de liberdade existe em uma dimensão analítica de toda instância empírica efetiva da ação social. Implica em toda capacidade socialmente incorporada dos atores em se apropriar, reproduzir e potencialmente inovar além da categoria cultural recebida e das condições de ação em acordo com seus ideais coletivos, interesses e comprometimentos.

Considerações finais

Dentro de cada área escolhida pelos autores supracitados há concordâncias ou entendimentos concernentes ao método de pesquisa. Cada qual de sua forma mostra a importância de estudos que contemplem aspectos que vão além do formal, que busquem entender a cultura e as estruturas nas quais os agentes participam. Cada época traz um arcabouço de referências necessárias para a interpretação de sua história, a busca por melhores entendimentos e análises é a melhor maneira de tentar entender o presente.


Referencias bibliográficas

CLEGG, S. R. As organizações modernas. Celta: Oieiras, Portugal, 1998.

EMIRBAYER, M.; GOODWIN, J. Network analysis, culture, and the problem of agency. The American Journal of Sociology, vol. 99, n. 6 (may). pp. 1411-1454. 1994.